Marcelo costumava perambular solitário pela noite, indo de bar em bar, de puteiro em puteiro, bebendo e metendo, não necessariamente nessa ordem, para esquecer dos infortúnios da vida. Nosso herói tem um filho que mora com sua ex-mulher, com quem manteve um relacionamento de final conturbado. Pegara sua esposa com outro na cama. O outro, ao contrário do clichê, não era seu melhor amigo mas seu pior inimigo, para aumentar ainda mais o tom melodramático da cena, que ficou guardada em sua memória perturbada.
Era uma noite quente de verão quando as luzes da escola pública em que lecionava Filosofia se apagaram, por ação de sabotagem de algum aluno vândalo, como era comum de acontecer naquela escola e em tantas outras escolas de bairros distantes. Imediatamente as aulas foram interrompidas fazendo com que Marcelo voltasse mais cedo para a casa, que ficava a poucos quarteirões da escola. Tomado por um mau pressentimento, Marcelo acelerou os passos, virou a esquina, andou mais um pouco ficando diante de sua casa. Virou a chave na porta e entrou. Da parte de cima da casa ouviu gemidos alucinados. Com o coração ritimado, subiu silenciosamente as escadas com passos cuidadosos. Chegando na parte de cima viu, ao abrir a porta do quarto, estarrecedora cena. Sua esposa, professora de educação infantil, posicionada de quatro sendo enraba por Heitor, seu algoz acadêmico, professor universitário de Filosofia, de umas das mais prestigiosas universidades. Ambos foram alunos na mesma turma, de início amigos, no final inimigos, suas carreiras profissionais tomaram rumos diferentes. Marcelo acusa Heitor de "furto intelectual", quando ambos concorriam a uma cadeira titular na universidade que fora conquistada por Heitor. Segundo Marcelo, Heitor lhe roubara a tese vencedora defendida por ele durante processo de seleção. Heitor ficou com a vaga enquanto Marcelo foi lecionar em escolas públicas da periferia.
Agora Heitor também lhe tomara a esposa, que gozava feito uma louca, diante de seus olhos incrédulos, ao ser enrabada com força e pegada pelo Heitor comedor, filósofo e fodão. Com o orgulho ferido, Marcelo largou sua esposa e passou a beber além da conta, o que lhe fez perder a guarda do filho. Esteve a ponto de ser exonerado da escola, acusado de lecionar alcoolizado. Desprovido de qualquer autoestima, passou a frequentar puteiros em busca de companhias, de bebidas e mulheres. Sem dinheiro, entrava em inferninhos baratos onde acabou se identificando com o ambiente e a decadência reinante na atmosfera desses lugares. A depressão aguda lhe trouxe problemas de ereção, então passava na companhia das putas conversando e bebendo, onde na maioria das vezes não transava. Pagava pelos serviços mas não usufruía dos prazeres da carne, apenas compartilhava com as garotas, histórias de vida tão ou mais trágicas que a dele. Eram horas de terapia barata de botequim regadas a muita bebida alcoolica. E a cada sessão o resultado era um buraco cada vez mais fundo cavado na sua alma ferida pela traição.
Até que um certo dia, Marcelo conheceu uma puta pela qual se apaixonou. A jovem garota, de 20 e poucos anos, tinha idade para ser sua filha, e uma beleza desgastada pela vida nada fácil da noite. Dona de uma melancolia peculiar, e uma bunda tão peculiar quanto, Samanta conquistou Marcelo, que expôs seus sentimentos a convidando para morar junto com ele em sua quitinete. A garota, comovida com o drama de nosso herói e ao mesmo tempo admirada pelo tipão inteligente dele, topou! E então foram morar juntos. Samanta era viciada em drogas, de início Marcelo apenas tolerava, mas logo passou a dividir o vício com a garota. Agora era definitivamente o fundo do poço, alcoolatra, drogado e corno. Marcelo, sem condições e disposição, abandonou as aulas e passou praticamente a viver as custas da garota, tal qual um gigolô imprestável.
No tempo ocioso que lhe sobrava, motivado pelas drogas talvez, Marcelo passou a refletir sobre a vida, dando vazão a sua veia filosófica que ainda lhe restara, e com o olhar perdido em algum ponto fixo do teto de sua Kit, fez-se a seguinte indagação:
Quem é o culpado? Quem caga na maçaneta ou quem abre a porta??
Depois de refletir alguns segundos sobre tão profunda questão, Marcelo conclui que a culpa total e absoluta pertence a quem abre a porta, pois o mundo é de quem sacaneia, esse é o jogo da vida, sacanear e ser sacaneado. Portanto, alguém tem que cagar na maçaneta para que o desatento suje a mão de merda. O mundo é dos espertos, pensou ele, e os otários são culpados por serem otários. No entanto, alguém cagou na maçaneta e Marcelo abriu a porta. Portanto, Marcelo pertencia ao time dos perdedores e frustrados e a culpa era dele e de mais ninguém.Era essa a conclusão dura e realista a que havia chegado, tinha a mão suja de merda cujo mau cheiro perturbava-lhe a alma ao mesmo tempo que os chifres pesavam em sua cabeça pensante de filósofo.
Samanta estava entediada e então resolveu improvisar. Chegou em casa com uma sacola de onde sacou uma cinta-caralha, dispositivo composto por um pinto de borracha preso a uma cinta. Rindo alucinadamente, despiu-se e prendeu a cinta-caralha em sua cintura. Marcelo sempre fora conservador em termos de sexo do tipo que não topava praticas sexuais alternativas. Sua mente aberta de filósofo era obtusa quando o assunto era sexo. No entanto, como Marcelo estava todo fodido na vida, Samanta não encontrou resistência para lhe foder literalmente. Botando Marcelo de quatro, enfiou-lhe o maranhão na bunda. Entorpecido, restou ao pobre infeliz submeter-se como um zumbi medonho aos caprichos diabólicos da prostituta. Que de salvadora transformara-se em megera arrombadora de cu virgem de filósofo bêbado e corno. Ao ser sodomizado, Marcelo sequer esboçava reação, aceitou tudo calado, com olhar perdido que só se mexia quando sua testa ia de encontro a parede a cada estocada mais forte desferida em seu cu, arrancando-lhe as pregas e entortando seus chifres.
Com o tempo Marcelo tomou gosto pela coisa a ponto de inovar as praticas boiolísticas, resolvendo então vestir-se de mulher, para espanto de Samanta. A inversão de papéis ganhou um ingrediente mais realista. As vezes Samanta chegava em casa e encontrava Marcelo vestido de peruca e saia usando suas calcinhas. Até que um dia Samanta se cansou de tudo isso, principalmente de sustentar Marcelo, e resolveu largá-lo. Desempregado e entregue aos vícios, aproveitou-se de sua nova fantasia sexual para prostituir-se. Botou scarpin nos pés, peruca e vestido e foi para esquina rodar bolsinha. Quando tinha um bom dinheiro guardado, Marcelo procurou um cirurgião. Colocou silicone nos peitos e na bunda, se transformando num verdadeiro travecão. Marcelo, então, tornou-se num dos travestis mais requisitados da boca. Agora Marcelo era Paloma Furacão, a diva pintosa.
Mas o destino, que lhe pregara as maiores peças, ainda lhe reservava a maior de todas. Certo dia Paloma estava fazendo ponto quando foi abordado por um cliente. O vidro do carro abriu e Paloma se aproximou o suficiente para ouvir a proposta. Alguns minutos de conversa e o programa estava fechado. Paloma entrou no carro que partiu. Foi quando Marcelo, ou melhor, Paloma, sentiu um calafrio lhe percorrer toda a espinha. Apesar de gordo e calvo, Paloma reconhecera o sujeito. Era ele. Heitor, seu algoz. De imediato, Paloma sentiu ódio profundo, para logo em seguida ser tomado pelo desespero. Por fim, Marcelo manteve a frieza e o controle necessários para que planejasse algo. Então, em poucos minutos, Marcelo tomou sua decisão guiado pelo desejo de vingança.Chegaram no hotel.
A maçaneta seria limpa.
No dia seguinte o noticiário trouxe a notícia de que um prestigioso professor universitário havia sido encontrado assassinado no quarto de um hotel barato, vitima de vários golpes desferidos por objeto pontiagudo. Seu corpo ensanguentado e sem vida vestia apenas uma calcinha vermelha, cheia de frufru. Na suas costas um V enorme, de viado, escrito em sangue.
Mesmo que tardiamente,a dor de corno estava vingada.